O conselheiro do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade). João Paulo de Resende recomendou nesta segunda-feira (8) a condenação de 12 empresas e 59 pessoas por formação de cartel em licitações públicas de trens e metrôs.
João Paulo de Resende é o relator do processo que investigou a ocorrência de suposta fraude em licitações de, pelo menos, 26 projetos ferroviários e metroviários em São Paulo, Distrito Federal, Minas Gerais e Rio Grande do Sul.
O tribunal do órgão começou a julgar o caso nesta segunda. O processo ainda precisa ser analisado pelos outros conselheiros do Cade.
Veja quais são as empresas acusadas de cartel pelo relator do processo no Cade:
Além da condenação das empresas e dos funcionários no suposto esquema de cartel, o relator do caso do Cade sugeriu aplicação de multa de R$ 968,6 milhões para as 12 companhias ? os valores mudam de acordo com a empresa.
Resende também recomendou cobrança de R$ 22,5 milhões em multas das 59 pessoas acusadas de envolvimento nas supostas irregularidades.
Em dezembro, a Superintendência-Geral do Cade solicitou a condenação de 16 empresas acusadas de envolvimento no esquema. Parecer do órgão divulgado na ocasião apontava que as empresas envolvidas no suposto cartel e os funcionários suspeitos de operar o esquema interferiram no resultado das licitações nessas quatro unidades da federação.
De acordo com o conselho responsável pelo combate a abusos do poder econômico, as companhias alvo do processo dividiram concorrências e combinaram valores das propostas. Ainda segundo as investigações, as fraudes incluíram institutos formalmente legais, como a formação de consórcio e a subcontratação, para dar uma aparência de competição ao cartel.
O caso começou a ser investigado a partir da celebração de um acordo de leniência entre o Cade e a empresa alemã Siemens.Seis ex executivos da companhia da Alemanha colaboraram com as investigações.
No acordo, os representantes da multinacional alemã revelaram que os contatos entre as empresas que disputavam as licitações de trens e metrôs ocorriam, pelo menos, desde 1998. O objetivo desta aproximação, conforme os delatores da Siemens, era eliminar a competição em licitações públicas de projetos do sistema ferroviário.
Com mais de 100 acusados citados no processo, a sustentação oral do julgamento durou mais de três horas. Alguns dos advogados usaram o tempo para fazer críticas à atuação do Cade no processo.
A advogada da empresa canadense Bombardier Paola Pugliese afirmou que a investigação se baseou no "pior acordo de leniência da história do Cade". A defensora reclamou que o processo foi permeado de irregularidade e pressa.
Para Paola Publiese, "o caso já está julgado". "O julgamento aconteceu a portas fechadas em total desrespeito ao contraditório e à legítima defesa", queixou-se a advogada.
Outros defensores também reclamaram que a Superintendência-Geral do Cade prejudicou o direito de defesa dos acusados.
>>> Entenda como funcionava o esquema de cartel de trens e metrôs em cada estado, segundo a investigação da Superintendência-Geral do Cade:
São Paulo: as investigações começaram em maio de 2013. O Cade obteve autorização judicial para operação de busca e apreensão na sede de empresas suspeitas de participar do cartel depois de acordo de leniência firmado entre Siemens, Ministério Público Federal e Ministério Público de São Paulo. A análise do material apreendido resultou na instauração do processo administrativo.
De acordo com o Cade, os contatos ilícitos começaram em 1998, no processo de licitação da Linha 5 do Metrô de São Paulo. Na época, as empresas Siemens, Siemens AG, Alstom, Alstom Transport, DaimlerChrysler (atualmente Bombardier), CAF, Mitsui e TTrans teriam combinado dividir a concorrência da licitação.
Outros processos fraudulentos foram identificados pelo Cade, em 2000, nas licitações para manutenção dos trens das séries 2000, 3000 e 2100 da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM).
Ainda de acordo com o Cade, em 2007 e 2008, ocorreu outra rodada de negociações entre as empresas para dividir o objeto de novas licitações da CPTM para contratação de serviços de manutenção. Teriam participado do acordo Alstom, Bombardier, CAF, Siemens, Temoinsa, Tejofran, TTrans, além de MPE e MGE.
A investigação também concluiu que houve o mesmo procedimento em 2009 e depois, entre 2011 e 2013, na manutenção de outras séries da CPTM com as mesmas empresas.
A extensão da Linha 2 do metrô de São Paulo também teve processo de licitação afetado por cartel, segundo a investigação do Cade.
Em nota conjunta divulgada no ano passado, o Metrô e a CPTM dizem que "são vítimas da denúncia investigada pelo Ministério Público. Por isso, colaboram com o processo.
Ainda segundo o comunicado, o Metrô e a CPTM são os maiores interessados na apuração das denúncias de formação de cartel ou de conduta irregular de agentes públicos e, assim, continuam à disposição das autoridades para prestar os esclarecimentos necessários".
À época, a Siemens disse que estava "cooperando com as autoridades brasileiras e não comenta investigações em andamento".
Distrito Federal: conforme a investigação da superintendência do Cade, houve, em 2005, acordo entre consórcios no projeto de manutenção da Companhia do Metropolitano do Distrito Federal.
O acordo entre o Consórcio Metrô Planalto (Alstom, IESA e TC/BR) e o Consórcio Metroman (Siemens e Serveng), segundo o Cade, tinha como objetivo dividir o projeto com subcontratação do consórcio perdedor pelo consórcio vencedor.
As empresas, de acordo com o órgão de defesa econômica, também supostamente negociariam os preços que seriam apresentados na licitação.
Rio Grande do Sul e Minas Gerais: as investigações do Cade apontaram ainda que, em 2012, a CAF e a Alstom também dividiram licitações destinadas à aquisição de trens e metrôs para a Empresa de Trens Urbanos (Trensurb), do Rio Grande do Sul, e a Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU), de Minas Gerais.
As empresas participaram das licitações, de acordo com o Cade, como um consórcio e definiram que a CAF ficaria com a maior parte do projeto da CBTU.
Já em relação à licitação para a Trensurb, as empresas combinaram que a maior parcela do projeto ficaria com a Alstom.
>>> O que disseram as empresas acusadas na ocasião em que a Superintendência-Geral do Cade pediu a condenação delas:
A CAF e a TTrans informaram que não comentam processos administrativos em andamento.
A Alstom disse que o parecer do Cade contém apenas uma recomendação e não se tratava de decisão final ou definitiva. "A Alstom avaliará em tempo hábil, após a decisão final do Cade, as medidas legais aplicáveis".
A Bombardier afirmou que "cooperou plenamente com a investigação do Cade, abrangendo todo o setor e continuará a fazê-lo".
A empresa Serveng Civilsan S.A. negou que tenha cometido qualquer irregularidade e disse que "respeita a legislação em vigor".
O G1 ainda não conseguiu contato com as outras empresas acusadas de cartel.
Fonte: G1