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   A economia mundial está a caminho de uma bela desaceleração

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O ex-presidente do Banco Central Affonso Celso Pastore avalia que a economia vai colecionar mais um ano de baixo crescimento em 2020, próximo de 1,5%.

Na leitura dele, um desempenho mais forte neste ano é difícil diante da série de incertezas na economia. A mais recente foi introduzida pelo avanço do coronavírus e a dúvida sobre qual será o tamanho do impacto no desempenho da atividade global. Mas também há questões locais, como a dificuldade do governo de avançar com medidas para concluir o ajuste fiscal e preservar o teto de gastos.

O cenário econômico, diz Pastore, também se tornou difícil porque os bancos centrais têm pouco espaço para estimular as economias por meio da queda dos juros, o que, em certa medida, pode tornar a situação atual mais complicada do que a observada na crise financeira de 2008.

A seguir os principais trechos da entrevista.

No ano passado, o PIB voltou a decepcionar. Qual é a avaliação que o sr. faz do desempenho da economia brasileira?

A pior notícia foi a queda no investimento. No Brasil, nós já chegamos a investir 20%, 21% do PIB em 2010 e 2011, na recuperação da crise de 2008 e 2009. Nós batemos uma taxa de investimento de 15%, 16% do PIB. Ela estava ensaiando uma ligeira recuperação. Há uma dificuldade enorme de você tirar incertezas que levam o país a investir mais. E, sem investimento, não há crescimento sustentável.

O crescimento de 1,1% em 2019 marca o terceiro ano consecutivo de crescimento próximo de 1%. Se você tomar em consideração que a população aumenta 0,8% ao ano, estamos com um avanço de renda per capita ridiculamente baixo, que não tem condição de sustentar um crescimento mais forte do consumo. O desempenho do ano passado não foi ruim porque houve um crescimento. Isso tem que ser reconhecido, mas foi muito pequeno, baixo e de qualidade ruim.

Qual é a expectativa para a economia neste ano?

A agenda de reformas tem de prosseguir. Em última instância, a consolidação fiscal é que vai tirar a incerteza dos investimentos e permitir que a economia volte a investir e aumente a capacidade produtiva. E a consolidação fiscal no Brasil tem que ser feita não com aumento de imposto, mas com controle de gastos. Com a reforma da Previdência, demos um passo adiante. Mas é um passo insuficiente. Além desse passo, temos que, no fundo, fazer uma reforma administrativa, que vai ter que ser feita para os novos entrantes. Ou fica politicamente inviável.

Se isso for feito, vamos dar um segundo passo na consolidação fiscal, mas é preciso mais. É preciso controlar os estados. Vários deles romperam o limite da Lei da Responsabilidade Fiscal. À medida que tudo isso for controlado, há uma noção de que a parte fiscal deixou de ser uma fonte de incertezas. Quando o Brasil tiver atingido esse ponto, eu não tenho dúvidas de que a confiança começa a voltar, e os investimentos crescerão.

Além da reforma administrativa, quais outras medidas devem ser adotadas?

Uma reforma tributária, que retire as distorções que impedem o crescimento de produtividade na economia. A reforma tributária abrirá espaço para que você tenha uma abertura da economia com o comércio internacional, que submeta a nossa indústria à competitividade. Tudo isso é necessário. Agora, essa agenda é longa. Temos de ir por partes. É um enorme de um bolo que tem de ser fatiado para você comer fatia por fatia, sendo que a fatia prioritária nesse momento é aquilo que garanta o cumprimento com o teto de gastos.

Como toda essa turbulência, como fica a expectativa de crescimento neste ano?

No fim do ano passado, havia um otimismo que se poderia ter um crescimento da ordem de 2,2% em 2020. Essa expectativa já foi embora. Isso tem a ver com esse acidente internacional que está acontecendo. Essa coisa imprevisível, que é um vírus, uma infecção para a qual você não tem remédio e que pode se espalhar mais.

Os governos estão usando recursos para minimizar (o impacto) do ponto de vista humanitário, de saúde. Mas isso produz uma queda na produção mundial e no comércio mundial. O valor das exportações mundiais e commodities vêm abaixo. Quer dizer, o crescimento das exportações que poderia ajudar o Brasil a ter um crescimento maior deixa de existir.

Quanto a economia mundial vai desacelerar?

Desaceleraria menos caso os bancos centrais desses países desenvolvidos tivessem instrumentos de política monetária. Na crise de 2008, eles tinham. As taxas de juros estavam mais altas tanto em operações curtas como nas longas. Hoje, as taxas de juros estão próximas de zero no mundo.

Numa situação como essa, contrariamente ao que aconteceu em 2008, quando foi possível aos bancos centrais ao redor do mundo adotarem medidas seríssimas de estímulo da economia com política monetária, dessa vez não existe instrumento chamado política monetária. A única coisa que existe é a capacidade de usar política fiscal.

E é possível usar a política fiscal?

Os Estados Unidos têm capacidade de usar a política fiscal. É um país com uma dívida pública grande, mas que tem taxa de juros menor do que a taxa de crescimento econômico. Portanto, não produz um efeito negativo. A Alemanha é um país que tem condições plenas de fazer isso.

O clima internacional que se instalou com esse coronavírus pode não ter a virulência do que foi 2008, que chegou a produzir uma recessão mundial. Mas nós estamos a caminho de uma boa desaceleração do crescimento mundial numa situação que, em certo sentido, é pior do que de 2008.

O Brasil tem espaço para corte de juros?

Eu acho que vai baixar a taxa de juros no Brasil. Mas Estados Unidos, que reduziram os juros e chegaram praticamente no limite, Japão e Europa não têm.

Algumas medidas adotadas pelos governos vão ter efeito. Mas será relativamente pequeno, o que indica que essa situação do coronavírus introduz uma componente adicional de incerteza. Consequentemente, a conclusão é que, no ano de 2020, infelizmente, vamos ter um crescimento baixo mais uma vez. Vai ser o quarto ano consecutivo de crescimento muito baixo.

Fora desse ambiente internacional, há uma expectativa grande para a agenda de reformas. O governo não tem uma base expressiva. Até onde podemos avançar?

Eu tenho a impressão de que o maior avanço no Brasil é a capacidade que a sociedade tem de se mobilizar para pressionar o Congresso. Isso ocorreu no caso da reforma da Previdência. O povo foi à rua para pressionar pela reforma.

Eu concordo que esse governo não tem base. Agora, existe uma equipe econômica que é melhor do que as equipes de muitos outros governos ? não de todos, mas de muitos outros. É uma equipe que tem um bom diagnóstico. Dentro do Congresso, há grupos de deputados que, no fundo, são sensíveis a este tipo de reforma, como foram sensíveis à reforma trabalhista, ainda no governo passado, como foram sensíveis à reforma da Previdência e eu acho que estão sendo sensíveis à reforma administrativa, à PEC Emergencial.

Nós vamos avançar lentamente. É um avanço ainda insuficiente para colocar o Brasil numa rota de crescimento, mas a minha visão a esse respeito é uma visão muito positiva.

Fonte: G1


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