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   Coronavírus vai provocar um choque mundial

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A economista Monica De Bolle não descarta que o coronavírus pode colocar o Brasil num quadro de estagnação ou mesmo de recessão neste ano.

Na avaliação da pesquisadora do Peterson Institute for International Economic, em Washington, o surto ? já classificado como pandemia pela Organização Mundial da Saúde (OMS) ? introduz um elemento de incerteza parecido com os cenários de crise financeira internacional.

No curto prazo, Monica avalia que o Brasil tem de adotar uma política anticíclica não apenas com a queda dos juros, mas também com o uso de medidas fiscais.

A seguir os principais trechos da entrevista.

A epidemia do coronavírus tem afetado a economia mundial como um todo. Como o Brasil se insere nesse contexto?

Há tempos o Brasil vem na contramão do crescimento mundial. Desde a recessão de 2015 e 2016, a economia brasileira vem se recuperando de forma extremamente lenta. Esse crescimento com base em taxas de 1% ao ano, em média, é muito aquém do que seria necessário para recuperarmos os níveis de PIB e renda de antes da recessão. Para os países que já divulgaram os seus números (referentes aos primeiros meses de 2020), esse choque (do coronavírus) já é aparente e, provavelmente, vai se estender e afetar outros trimestres de 2020. Mas, ao menos para vários desses países, é um choque que acontece com as economias vindas de situações relativamente robustas. O que não é o caso do Brasil.

E quais serão os principais canais de ?transmissão? do coronavírus para a economia brasileira?

Esse choque chega por uma série de vias. A principal delas é a via em comum com o restante da economia mundial. Uma situação como essa, de uma pandemia com um vírus novo, onde não se tem ainda uma real noção do impacto em diferentes países, cria incerteza. Não é nem risco, é incerteza. Isso gera um grau de incerteza entre as pessoas: o que vai acontecer? Como vai ficar minha vida daqui para frente? Será que eu preciso poupar para o que quer que seja que venha acontecer com essa epidemia?

Esse tipo de reação não chega a ser um pânico, mas essa sensação de ansiedade extrema perante à incerteza bloqueia consumo, investimento e produção. Não é muito diferente do que acontece quando há uma crise financeira que paralisa as economias.

Quais outros canais você destacaria?

Queda no preço das commodities, já que a sensação de incerteza afeta os preços de produtos básicos, em meio à desaceleração na China, que é um dos nossos principais parceiros comerciais. Há ainda a desaceleração global, que obviamente nos afetas, porque somos parte da economia mundial. Além da alta súbita de aversão ao risco, porque os investidores, temendo o que vai acontecer com a economia, deixam de investir no Brasil. Esses canais se juntam à ideia mais ampla de incerteza que paralisa. Ou seja, vem pelos canais externos, mas vem também pela situação de absoluta incerteza que a própria economia brasileira e diferentes atores dentro dela estão se deparando neste momento.

Diante desse cenário, qual a sua projeção para o PIB do Brasil em 2020?

Sem coronavírus, eu nunca achei que o Brasil fosse capaz de crescer 2% em 2020 e por uma razão muito simples: o Brasil é um país que perdeu o dinamismo, o que está evidente nesse ritmo de crescimento fraco desde 2017.

Antes do coronavírus, a trajetória da economia brasileira já era compatível com a manutenção desse ritmo de 1%, talvez um pouquinho mais de 1%, mas nada perto de 2%. Com o coronavírus ? e com esse choque se estendendo até o final do ano, que é provavelmente o que vai acontecer, já que estamos no início da epidemia no mundo ?, me parece que a economia brasileira está correndo um risco muito sério de ter não só uma taxa de crescimento muito mais baixa do que 1%, mas há um risco, eu acho, não desprezível, de um PIB estagnado ou até de uma levíssima recessão.

Como reverter essa situação?

No curto prazo, esse quadro é muito difícil de reverter, se não impossível. As reformas são todas importantes, mas olhando para o médio ou longo prazos. Quem achou que as reformas teriam efeito no curto prazo estava iludido com a história de que as reformas trazem confiança, e confiança traz investimento e aí a economia reage. Isso é papo furado. As reformas são muito importantes sim para a economia brasileira, mas não são elas que vão destravar crescimento no curto prazo.

O que vai permitir a retomada do crescimento, então?

A única forma de você engatar a economia no curto prazo é lançar mão de medida macroeconômica contracíclica. Na área monetária isso está acontecendo porque as taxas de juros estão super baixas. O Banco Central lançou uma porção de outras medidas, além da redução dos juros, para tentar animar um pouco a economia, mas isso não tem sido suficiente. Precisaria haver uma ajudinha da política fiscal. O problema é que hoje no Brasil a gente não tem muito espaço para fazer política fiscal contracíclica, ou pelo menos o governo está convencido de que não tem.

Além das políticas contracíclicas, o que poderia ser feito?

Um fator que o governo ignora por completo é a questão do mercado de trabalho. Quando a gente olha os dados, há aumento de informalidade e de emprego precário. Ou seja, não cria o tipo de segurança econômica que as pessoas precisam ter. Sem isso, não tem economia que cresça no curto prazo. E aí também passam assuntos como, por exemplo, a educação. O Brasil tem uma mão de obra pouco qualificada. Qualificação é extremamente importante no Brasil.

Como essa questão da educação pode ser encaminhada?

Com uma política educacional que vai criar uma esperança no médio e no longo prazos. A gente não tem isso no Brasil. Hoje, a discussão sobre a educação está totalmente disfuncional. Temos problemas na área de educação, na maneira como se tem tratado, por exemplo, os temas relacionados às pesquisas no país, às universidades públicas e ao financiamento que elas precisam ter e uma porção de outras coisas que foram ideologizadas pelo governo. Essa ideologização não ajuda em nada a resolver os problemas econômicos, nem os de curto prazo nem os de longo prazo.

Alguns países já anunciaram medidas de estímulo para tentar evitar uma crise econômica em 2020. Essa ação internacional pode ajudar o Brasil?

A gente vai ver, muito provavelmente, talvez de forma mais ou menos coordenada, algum tipo de ação conjunta entre os principais bancos centrais no mundo e, quem sabe, pelo menos para aqueles países que têm capacidade de fazer isso, alguma ação do lado fiscal. Se isso acontecer, ajuda, pelo menos, a fazer com que esse choque seja um pouco menos negativo. Portanto, as sequelas disso para o Brasil seriam menores. Mas, de qualquer forma, não há dúvida de que o impacto no Brasil é negativo. Pode ser mais ou menos negativo, a depender dessas ações coordenadas que podem vir a acontecer.


Fonte: G1


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